sábado, 15 de setembro de 2007

Perfume

(curta metragem de uma história sonhada com os olhos bem abertos)

1ª Cena – A surpresa

De surpresa, um odor doce e intenso inunda-me a alma e abraça-me ser.
Fecho os olhos e inspiro-o profundamente antes de olhar em meu redor.
Ao abrir os olhos vejo apenas um vulto negro.
Um corpo elegante de mulher, envolto num vestido preto, a deslizar por entre a multidão colorida.
Sigo-a, fazendo o meu caminho ao sabor do perfume disperso no ar.
Inesquecível.
Interessante.
Deixo de a ver.
Perco-a de vista por entre a música e as gargalhadas de alegria.
Procuro-a pelas longas e agitadas salas do palácio de nuvens brancas.
Corredores infinitos inundados pelo aroma inebriante.
Não a encontro.
Volto às conversas banais e penso ter imaginado tudo.
Mas o perfume ainda lá está.
Suspenso no ar.

2ª Cena – A curiosidade

Por detrás da máscara branca, finjo tomar atenção a todas as palavras que me são dirigidas.
Na verdade, por detrás da máscara branca os meus olhos correm todo o espaço, numa procura incessante.
Volto a inspirar profundamente.
O perfume entra em mim.
Flúi por mim e misturando com o sangue quente que me corre nas veias ao ritmo da música feita nas asas da inspiração.
Sinto a magia.
A curiosidade mata-me devagar pela sede que tenho de saber a fonte de onde emana esse misterioso odor.
De que corpo, de que pele?
De que perfil, de que silhueta de sonho?

Mas sonho não pode ser.
É real demais para ser apenas fruto da imaginação.
Tão real como a necessidade de o respirar.

3ª Cena – O encontro

Percorro e observo toda a sala, uma última vez.
Demoradamente.
Estou prestes a fazer daquele corpo envolto num vestido preto, apenas uma lembrança.
Uma ilusão.
Mas, num instante de atracção, o meu olhar fica preso a outro olhar por detrás de uma máscara preta.
Dois olhos escuros, de uma luminosidade infinitamente cativante prendem-se aos meus por um segundo.
Depressa se baixam numa charmosa e deslumbrante timidez.
Não lhe resisto.
Avanço por entre as pessoas e os chapéus altos e os penachos sedosos, sem nunca desviar a minha atenção.
Quem és tu?
Quem se esconde atrás dessa máscara preta?

Sem palavras, pega-me na mão e conduz-me até à pista de dança.
Encosta-me a si.
Dançamos por todo o tempo de uma noite sem fim
Por todo o tempo que um instante pode demorar.

4ª Cena – O beijo

O seu perfume intensifica-se em mim.
Impregna-se-me na pele e na alma.
Os meus braços fundem-se nos seus como inquebráveis laços.
Sinto todo o seu calor.
Os nossos lábios aproximam-se, lentamente.
Tocam-se, suavemente:
Um beijo.
A música calma embala-nos o momento.
As luzes surgem nos céus em comemoração.
Cores e mais cores pintam o cenário de fundo.
Mesmo por cima da floresta de bambu.
No relvado, coberto de neve, desenrola-se a elegante dança de um grou.
No lago gelado, a água da fonte mágica sobe e desce e volta a subir com a força da paixão.
Com a força do desejo.
E duas silhuetas esculpidas pelo luar, avançam pelo desconhecido da noite.
Rumo a qualquer canto do mundo.
Com o delicioso perfume, à nossa volta, disperso no ar.