quinta-feira, 24 de abril de 2008

Renascer

A escuridão da rua, molhada pelas lágrimas que caem embaladas pelo triste pranto dos céus, esconde-se atrás do vidro baço, embaciado pela avidez das bocas, coladas em longos, quentes e doces beijos.
A usual angústia que aperta os peitos fica, por completo, do lado de fora.
A escuridão é apenas uma sombra dos corpos iluminados pela imensa luz do fogo, ardente, inflamado pela louca fricção das peles e pela ternura de contactos dóceis e despudorados.
No ar, como um aroma perfumado e confortável, paira a certeza que é chegada a hora.
Porque nas entrelinhas das palavras proferidas ao ouvido, existe um brilho único nos olhares que validam a promessa de eternidade dos sentimentos e a confissão de profundos desejos.
Porque o tudo é muita coisa e se torna possível apenas porque os dias e as noites já não suportam o vazio dos espaços e a dor da falta imposta pela distância, medida palmo a palmo, em tempo, segundo após segundo.
E presente é o momento de voltar a nascer e a crescer para sensações demasiado fortes e sinceras para serem esquecidas em impostas ideias impregnadas de irrealismo, diminuídas, despojadas de todos os sentidos, quando o que revela a coragem dos amantes é a incontrolável vontade de serem um e serem maiores e serem ilimitados.
Pois que caia toda a chuva que as nuvens consigam suportar e que o céu e os raios e os trovões desabem de uma vez sobre as vidas e sobre o mundo.
Que depois, ficam apenas as memórias e na terra limpa surge o espaço livre para o renascer dos corpos e das almas e dos sentidos, presos ao chão, a respirar o oxigénio renovado e a olhar sempre para cima, sempre mais além, a tentar alcançar o azul e todas as outras cores do arco-íris, invertido, no céu como um sorriso universal.
Porque renascer, crescer e viver tudo de outra vez, não faz nenhum mal.